.jpg)
Durante 4 meses, Bárbara esteve internada no hospital e escreveu um livro intitulado “(In)compatibilidades” onde conta a sua experiência quase-morte e a sua passagem tão prolongada pelo hospital. Como tinha vários conhecimentos na área, a publicação foi relativamente fácil e o livro foi um sucesso! Actualmente (em 2010) Bárbara encontra-se a escrever um novo livro desta vez intitulado “Ver ou viver” onde tenta passar a mensagem às pessoas de como podem e devem aproveitar a vida e fazerem o que realmente gostam. Deixo aqui algumas passagens do Preâmbulo do primeiro e do segundo livros onde ela conta a sua história de vida e como vive actualmente.
O meu nome é Bárbara Galvão. Nasci a 15 de Maio de 1972 em Belém, Lisboa, onde sempre morei. Sou filha de António Galvão e Maria do Carmo Galvão e tenho um irmão mais velho, João Galvão. Sou uma pessoa forte, corajosa, que gosta de arriscar e que nunca desiste. Sou teimosa e gosto de levar as minhas ideias avante.
A minha mãe faleceu quando eu tinha 2 anos, fui criada pelo pai, pelo meu irmão e pela minha empregada Júlia Trigueiros. Tenho poucas recordações da mãe, apenas algumas fotografias. Mas contudo, pode dizer-se que tive uma infância feliz.
O meu irmão é médico e vive nos Estados Unidos da América desde os 30 anos onde exerce a sua profissão como neurocirurgião e onde tem uma mulher e dois filhos. Nunca vi os meus sobrinhos, ele nunca mos veio mostrar. Talvez um dia ainda vá a tempo!
A minha grande referência é o meu pai. Posso dizer que é o meu ídolo, nem sei bem porque, talvez pela maneira de ele estar na vida, por ter conseguido sempre conjugar o trabalho com a família. Ele era dono e gestor de uma grande empresa de publicidade
Desde essa época que eu vivia num stress constante, sempre enfiada no trabalho, com pouco tempo para me alimentar e praticamente sem amigos. Só agora percebo e vejo como realmente não tenho amigos. Os da empresa são apenas colegas de trabalho, saíamos de vez em quando, mas nada do outro mundo, nunca foi uma relação por aí além. Fora da empresa não tenho mesmo ninguém, os meus pais já cá não estão, a Júlia também se foi embora quando o meu pai morreu, o meu irmão já se sabe. Podia ainda ter amigos da faculdade, mas nem isso, todos se tinham mudado para conseguirem arranjar emprego. Nunca me preocupei em constituir família, o meu principal objectivo era a chefia da empresa, pois não queria desiludir o meu pai. Além de que estava a fazer uma coisa que me dava muita “pica”. Aquele poder todo sabia-me bem. E hoje, como vejo que não serviu para nada…
Aos 30 anos, numa consulta médica de rotina a que éramos todos obrigados na empresa, diagnosticaram-me uma cirrose não muito grave se eu alterasse o meu estilo de vida. Disseram-me mesmo que podia viver muito tempo se fizesse uma alimentação melhor e reduzisse o stress na minha vida. Lembro-me perfeitamente desse dia. Disse “Sim senhor doutor, esteja descansado, eu vou mudar”, mas assim que saí do consultório foi como se ele não me tivesse dito nada. Voltei para o meu gabinete e continuei com o ritmo alucinante que levava. Mal fiz eu!!
3 anos mais tarde, continuando sempre com o ritmo que levava desmaiei na empresa e levaram-me para o hospital onde, depois de vários exames médicos me é diagnosticado um cancro no fígado. A minha cirrose agravara-se e evoluíra de uma forma que não era possível reverter sem intervenção cirúrgica. A única hipótese de vida era um transplante hepático. Fiquei em choque! Não sabia o que dizer, não sabia como reagir. Vi por momentos a minha vida toda a passar como um filme em modo muito rápido… O médico disse que me ia pôr em lista de espera e saí ainda petrificada. Não sabia bem o que fazer, ainda não estava consciente das consequências que aquilo poderia ter na minha vida. Se ao menos o tivesse ouvido da primeira vez!
Um dia, estava eu a estacionar à porta de casa e sei que não me senti lá muito bem. Perdi os sentidos dentro do carro. Não me lembro de mais nada, lembro-me de ter acordado mais tarde numa cama de hospital pronta para ir ser operada. Fiquei depois a saber que um vizinho me tinha visto e chamou o 112. Sei também que tive algum tempo em paragem respiratória. Num capítulo à frente hei-de contar-vos o que senti e vi nesse momento.
A minha recuperação está a ser muito lenta, parece que o fígado não está a gostar muito de estar no meu corpo, pudera, com a vida que ele tem, acho que ninguém gostava! Estou com muitas dores, sinto-me como se tivesse sido atropelada por um camião. Tenho passado os últimos dias aqui no quarto, sozinha. Quando acordei, senti-me muito desesperada, não sabia o que fazer, quem avisar, não tinha ninguém! Falei ao telefone com o meu irmão, ele prometeu que viria cá assim que pudesse. Vamos ver! Agora já me sinto melhor, mais calma pelo menos, que as dores, essas teimam em não passar.
Não sabia o que fazer, naqueles dias que estava aqui desesperada, até que a enfermeira (uma jóia de pessoa!) me trouxe um caderno, onde resolvi começar a escrever o que estava a sentir. E agora aqui está esse produto final, fruto de 4 meses de internamento, que me fizeram ter uma visão completamente diferente da vida.
Preâmbulo do livro “(In)compatibilidades” de Bárbara Galvão
Lembro-me perfeitamente daquele dia, estava muito contente. Tinha dormido bem e acordei bem-disposta. O médico entrou como todos os dias, rodeado de outros médicos estagiários e dos enfermeiros. Lá disseram tudo o que dizem todos os dias, cheios de termos técnicos e bla bla bla. Uma pessoa, ao fim de 4 meses já desliga! Naquele dia não desliguei, senti que me iam dizer algo diferente e disseram mesmo! Disseram que os exames estavam óptimos e que já podia ir para casa. Lembro-me que sorri e ao mesmo tempo fiquei melancólica. Era o momento de tomar decisões, de seguir em frente. De fazer todas as mudanças que tinha pensado e escrito. Não sabia por onde começar.
Saí do hospital, fui até à minha empresa, convoquei uma reunião com todos e anunciei que me ia embora de vez. Nomeei um novo chefe, assinei uma data de papéis e saí, sem sequer passar no meu antigo gabinete. Todos ficaram espantados a princípio com a minha decisão, mas acabaram por compreender. Despedi-me dizendo “Aproveitem a vossa vida! Há mais para além deste escritório”.
Só então fui a casa. Como parecia tudo diferente depois de todo aquele tempo! Arrumei todas as coisas que me pudessem fazer falta, reguei as plantas e saí a caminho da estação de comboio. Durante toda a viagem já começava a pensar se estava a fazer o correcto. Reli várias vezes os meus manuscritos e percebi que estava a fazer o melhor!
Cheguei a Cuba, no Alentejo, numa tarde solarenga, com um calor abrasador. Tinha lá uma casa de família que há muito não visitava e quando pensei em mudar de vida, nada melhor do que ir viver para o campo, onde o tempo anda ao ritmo que nós bem entendermos. Ainda andei uma boa meia hora a pé, com uma mochila às costas. Sentia-me cansada, ainda estava um pouco frágil. Cheguei!! Vi aquela fachada amarela, aquele jardim em volta. Já precisava de um arranjinho! Entrei. A casa estava como me lembrava dela. E há muito tempo que lá não ia. Tinha pó, sim, mas nada que uma limpeza não resolvesse. Senti que era ali que ia conseguir mudar de vida. Aliás, na verdade já tinha mudado. Desde que saíra do hospital já não tinha a mesma vida, já não era a mesma pessoa. Agora só tinha um lugar bem diferente do meu habitual onde iria viver.
Hoje vivo nesta casa, já é mesmo minha, já a cativei! Por vezes penso como seria se ainda tivesse ficado em Lisboa. Não imagino! E penso no meu pai. O que será que ele pensa? Será que percebe porque deixei tudo? Acho que ele iria entender. Eu não tive a mesma destreza dele para conciliar o trabalho e a vida pessoal, nunca o consegui, se calhar porque não tinha vida pessoal. Agora tenho, e estou muito feliz com ela. Um dia gostava de formar uma família, ter um filho ou dois. Mas acho que já vou tarde, com os meus 38 anos, se calhar não vai mesmo passar de um desejo, vamos ver! Vamos ver que mais mudanças me reserva o destino…
Parte do Preâmbulo do livro “Ver ou Viver” de Bárbara Galvão
Hoje, Bárbara vive na moradia em Cuba, no distrito de Beja. Dedicou-se bastante à jardinagem, e é algo que lhe dá muito prazer. Continua a escrever o seu segundo livro, que está quase no fim. Passa os dias entre a sua casa, o seu jardim, ou a esplanada onde gosta de ir ter com alguns vizinhos e amigos que entretanto fez na terra. Fala muitas vezes da vida em geral, e tenta perceber como os outros que a rodeiam aproveitam a vida. Tenta fazer-lhes ver que devem fazer o que realmente gostam e não desperdiçar a vida com coisas fúteis e inúteis, que não trazem nada para além de stress e rugas na pele! Tem uma vida calma e pode dizer-se que feliz.
De quando em quando vai a Lisboa ao médico para ver se continua tudo bem. Viaja também algumas vezes pelo país para fazer apresentações do seu livro e sessões de autógrafos.
Tem um andar calmo, anda sempre sorridente e com roupas floridas. O seu cabelo que antes era curto e despenteado, agora é comprido, sempre enrolado numa trança que lhe cai para o lado direito, e usa sempre um chapéu de palha.
Já todos a conhecem como a senhora da cidade que veio para o campo, e que escreveu um livro. É famosa, dizem eles! Mas ela não se sente como tal. Já se sente da terra. Sente-se como a pessoa que conseguiu mudar de vida e que agora a sabe aproveitar!
[Bárbara Galvão é uma criação de Inês Santos]
Parabéns pela forma como assumiste esta experiência. Obrigado
ResponderEliminarGostei deste relato todavia, infelizmente não podemos sempre realizar aquilo que dezejamos... parabéns pela transição, é uma heroina:)
ResponderEliminar